O que é a Monitorização de Resultados e os Sistemas de Feedback?
A monitorização de resultados tem como objectivo melhorar os resultados finais das psicoterapias, recolhendo informações sobre a progressão das intervenções psicológicas e providenciando essas informações ao terapeuta de modo a melhor adaptar a intervenção às necessidades do paciente.
A rotina de monitorização de resultados com sistemas de feedback articulam a prática clínica com a investigação empírica. A monitorização de resultados é também denominada investigação focada no paciente ou evidência baseada na prática. Trata-se de uma resposta aos movimentos dos tratamentos empiricamente validados, que insistiram na necessidade de apenas intervenções baseadas na evidência empírica serem consideradas como cientificamente válidas. Pelo contrário, a monitorização de resultados assenta no pressuposto de que a evidência decorre do próprio processo psicoterapêutico, no qual as variáveis do paciente, da pessoa do psicoterapeuta e da capacidade deste ser responsivo, suplantam amplamente a manualização da intervenção. [0] A rotina de monitorização de resultados é realizada através de sistemas de feedback, que para além de realizarem uma leitura objectiva dos resultados da psicoterapia, executam uma leitura sobre factores relevantes do processo terapêutico que podem influenciar a trajectória da intervenção psicológica, como por exemplo a qualidade da aliança terapêutica. O uso destes sistemas de feedback complementa a leitura clínica do terapeuta, tendo sido demonstrado que poderão melhorar significativamente os resultados clínicos finais e diminuir o número de dropouts. [1, 2]
Vários sistemas de feedback têm sido desenvolvidos ao longo dos últimos anos. Os dois sistemas com maior suporte empírico são o Outcome Questionnaire System (OQ System)[3] e o The Partners for Change Outcome Management System (PCOMS)[4], tendo ambos sido reconhecidos pela Substance Abuse and Mental Health Administration’s National Registry of Evidence-based Programs and Practices. A Clínica ISPA e a Academia Psicoterapeutas têm parcerias com as organizações que detêm os direitos destes dois sistemas de feedback, e têm sido percursoras na introdução da rotina de monitorização de resultados em psicoterapia em Portugal.
Os sistemas de feedback têm vindo a acumular provas da sua eficácia, especialmente para clientes em risco de deterioração clínica. Até hoje, mais de uma dúzia de ensaios clínicos randomizados (“RCT’s”) e várias meta-análises avaliaram o impacto dos sistemas de feedback em psicoterapia.
Estes estudos sugerem que os sistemas de feedback podem, no melhor dos casos: duplicar o número de clientes a atingir melhorias significativas; baixar para metade a taxa de “dropout” em terapia; reduzir para um terço o risco de deterioração clínica; e reduzir em dois terços a duração da intervenção. [5]
Na maior meta-análise até hoje sobre o uso de sistemas de feedback, Shimokawa, Lambert e Smart (2010) analisaram os resultados de estudos a comparar intervenções “com sistemas de feedback” e “sem feedback” (“treatment-as-usual”). Numa amostra total de 6151 clientes, esta meta-análise reportou que os clientes em risco de deterioração estariam em média 70% melhor na condição de intervenção “com feedback”. [6, 2]
Figura 1. Impacto clínico do uso de sistemas de feedback (Lambert & Shimokawa, 2011)[2]
A utilização de sistemas de feedback é também importante porque os terapeutas têm frequentemente uma avaliação enviesada do seu próprio desempenho clínico e do estado da aliança terapêutica. [7, 8, 9] Para além disso, a maioria dos psicoterapeutas tem grande dificuldade em identificar a existência de deterioração clínica nos seus clientes. [10] Todas estas questões podem ser significativamente reduzidas através do uso de sistemas de monitorização de resultados. [1, 2] [11]
Assim, a rotina de monitorização de resultados dá resposta a um conjunto de desafios identificados pela investigação:
- Permitem uma estimativa fiável de eficácia clínica do terapeuta. [12]
- Permitem avaliar o estado da aliança terapêutica e identificar clientes em deterioração clínica. [12, 1, 4]
- Baseiam-se no auto-relato do cliente, que é o melhor preditor de resultados clínicos. [13, 14, 15, 16]
- Incentivam o envolvimento e participação activa do cliente no seu próprio processo terapêutico, variável essencial para o sucessso terapêutico. [17, 16]
- Permitem receber feedback contínuo sobre o desempenho do profissional, actividade que está intrinsecamente ligada ao desenvolvimento de desempenho superior, ou "expertise", em qualquer área de trabalho, incluindo na prática psicoterapêutica. [18, 19]
O princípio fundamental passa pela recolha de informação, a partir do auto-relato do paciente, sobre a forma como se sente e como está a decorrer o processo psicoterapêutico. A recolha é realizada com instrumentos e escalas de auto-relato, que avaliam aspectos do funcionamento psicológico da pessoa, tal como dimensões relacionadas com a psicoterapia propriamente dita. Os dados recolhidos são devolvidos aos psicoterapeutas, fornecendo um feedback directo sobre o paciente. Os dados apresentados têm diferentes configurações. O resultado da psicoterapia a decorrer pode ser comparado a dados normativos, dando uma referência se o processo está a evoluir favoravelmente ou não. Neste sentido, o progresso da psicoterapia é avaliada, par a par, com uma curva expectável de tratamento.
Conheça mais sobre a investigação relevante e como começar a estabelecer uma rotina de monitorização de resultados:
[0] Lutz, W., De Jong, K., & Rubel, J. (2015). Patient-focused and feedback research in psychotherapy: Where are we and where do we want to go?. Psychotherapy Research, 25(6), 625-632.
[1] Boswell, J. F., Kraus, D. R., Miller, S. D., & Lambert, M. J. (2015). Implementing routine outcome monitoring in clinical practice: Benefits, challenges, and solutions. Psychotherapy research, 25(1), 6-19.
[2] Lambert, M. J., & Shimokawa, K. (2011). Collecting client feedback. Psychotherapy, 48(1), 72.
[3] Lambert, M. J. (2015). Progress feedback and the OQ-system: The past and the future. Psychotherapy, 52(4), 381.
[4] Duncan, B. L., & Reese, R. J. (2015). The Partners for Change Outcome Management System (PCOMS) revisiting the client’s frame of reference. Psychotherapy, 52(4), 391.
[5] Miller, S. D., Hubble, M. A., Chow, D., & Seidel, J. (2015). Beyond measures and monitoring: Realizing the potential of feedback-informed treatment. Psychotherapy, 52(4), 449.
[6] Shimokawa, K., Lambert, M. J., & Smart, D. W. (2010). Enhancing treatment outcome of patients at risk of treatment failure: meta-analytic and mega-analytic review of a psychotherapy quality assurance system. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 78(3), 298.
[7] Walfish, S., McAlister, B., O'donnell, P., & Lambert, M. J. (2012). An investigation of self-assessment bias in mental health providers. Psychological Reports, 110(2), 639-644.
[8] Tryon, G. S., Blackwell, S. C., & Hammel, E. F. (2007). A meta-analytic examination of client-therapist perspectives of the working alliance. Psychotherapy Research, 17(6), 629-642.
[9] Hartmann, A., Joos, A., Orlinsky, D. E., & Zeeck, A. (2015). Accuracy of therapist perceptions of patients' alliance: Exploring the divergence. Psychotherapy Research, 25(4), 408-419.
[10] Hatfield, D., McCullough, L., Frantz, S. H., & Krieger, K. (2010). Do we know when our clients get worse? An investigation of therapists' ability to detect negative client change. Clinical Psychology & Psychotherapy, 17(1), 25-32.
[11] Duncan, B.L. (2015). The person of the therapist: One therapist’s journey to relationship. In Schneider, K.J., Pierson, J.F., & Bugental, J.F.T. (Eds.) The Handbook of Humanistic Psychology: Theory, research, and practice (pág. 457-472). Thousand Oaks, CE: Sage.
[12] Lambert, M. J. (2010). “Yes, it is time for clinicians to monitor treatment outcome.” In B. L. Duncan, S. C., Miller, B. E. Wampold, & M. A. Hubble (Eds.), Heart and soul of change: Delivering what works in therapy (2ª ed., pág. 239 –266). Washington, DC: American Psychological Association.
[13] Bohart, A. C., Elliott, R., Greenberg, L. S., & Watson, J. C. (2002). Empathy. In J. Norcross (Ed.), Psychotherapy relationships that work (p. 89– 108). New York: Oxford University Press.
[14] Busseri, M. A., & Tyler, J. D. (2004). Client–therapist agreement on target problems, working alliance, and counseling outcome. Psychotherapy Research, 14(1), 77-88.
[15] Elliott, R., Bohart, A. C., Watson, J. C., & Greenberg, L. S. (2011). Empathy. Psychotherapy, 48(1), 43.
[16] Bohart, A. C. (2000). The client is the most important common factor: Clients' self-healing capacities and psychotherapy. Journal of Psychotherapy Integration, 10(2), 127.
[17] Levitt, H. M., Pomerville, A., & Surace, F. I. (2016). A qualitative meta-analysis examining clients’ experiences of psychotherapy: A new agenda. Psychological bulletin, 142(8), 801.
[18] Miller, S. D., Hubble, M. A., Chow, D. L., & Seidel, J. A. (2013). The outcome of psychotherapy: yesterday, today, and tomorrow. Psychotherapy, 50(1), 88-97.
[19] Goodyear, R. K., Wampold, B. E., Tracey, T. J., & Lichtenberg, J. W. (2017). Psychotherapy expertise should mean superior outcomes and demonstrable improvement over time. The Counseling Psychologist, 45(1), 54-65.