A prática deliberada é hoje reconhecida como possivelmente a variável mais relevante para o desenvolvimento de "expertise" ou desempenho superior em qualquer área de trabalho. A sua importância já foi demonstrada em áreas tão distintas como o desporto, a medicina, a música, o xadrez e, mais recentemente, a prática psicoterapêutica. O seu pressuposto central é que o desempenho superior, ou "expertise", é adquirido gradualmente através do investimento em tarefas de treino que o indivíduo possa dominar sequencialmente. Geralmente, o planear e avaliar destas tarefas é feito com o apoio de um professor ou coach. [1]
Figura 1. Os 4 pilares da Prática Deliberada (Rousmaniere et al., 2017) [14] |
Tradicionalmente, vários sistemas de ensino têm-se focado quase exclusivamente no acumular de conhecimento, por exemplo através da leitura, deixando muitas vezes o aluno com a tarefa de aplicar esse conhecimento por si. No entanto, Norcross et al. destacam que saber sobre psicoterapia é muito diferente de saber fazer psicoterapia. Segundo estes autores, é possível ser-se um "expert" sobre psicoterapia sem que isso queira dizer que se é um terapeuta eficaz, já que conhecimento teórico e aplicação prática são duas actividades muito distintas, ainda que complementares. [2] Ao contrário do ensino mais tradicional, a prática deliberada foca-se no desempenho do profissional e em modos de o melhorar fiavelmente. Para este fim, são criadas tarefas que servem o propósito de refinar gradualmente o seu desempenho através de repetições, feedback e monitorização continuada. Estas tarefas são altamente individualizadas, criadas especificamente para o profissional em causa e focadas nas suas competências ainda por desenvolver. [3, 1]
Talvez controversamente, a investigação em psicoterapia tem vindo repetidamente a demonstrar a inexistência de correlação significativa entre os anos de experiência terapêutica e os resultados obtidos. [4, 5, 6] Embora uma grande parte dos terapeuta acredite estar a melhorar o seu desempenho ao longo do tempo, esta auto-avaliação é frequentemente enviesada ou mesmo incorrecta. [7, 8, 9] Com efeito, simplesmente trabalhar mais horas não é o suficiente para explicar melhores desempenhos profissionais. |
Por outro lado, é necessário distinguir o conceito de "expertise" ou desempenho superior do de competência, já que a perícia a administrar factores específicos em psicoterapia - como técnicas associadas a modelos específicos - parece não se relacionar com os resultados obtidos. Assim, a "expertise" em psicoterapia define-se não pela mestria nestes ingredientes específicos mas pela obtenção de resultados clínicos mensuráveis consistentemente superiores. [10, 11, 12]
A prática deliberada exige um esforço e foco mental, tal como um investimento pessoal e profissional, bastante superior àquilo a que geralmente designamos de "experiência". A verdadeira prova da sua aplicação bem sucedida não é o número de horas passados a treinar tarefas ou o conhecimento teórico sobre as mesmas, mas sim a avaliação e verificação de resultados demonstravelmente superiores ao longo do tempo. [13, 12]
Figura 2. O ciclo da prática deliberada (Rousmaniere et al., 2017) [14]
Segue-se uma lista de características fundamentais da prática deliberada (PD). [3, 15]
Conheça mais sobre a investigação em prática deliberada e como começar a estabelecer uma rotina:
[1] Ericsson, K. A. (2006). The influence of experience and deliberate practice on the development of superior expert performance. In K. A. Ericsson, N. Charness, P. J. Feltovich, & R. R. Hoffman (Eds.), The Cambridge handbook of expertise and expert performance (p. 683–703). Cambridge, UK: Cambridge University Press.
[2] Norcross, J. C., & Karpiak, C. P. (2017). Our best selves: Defining and actualizing expertise in psychotherapy. The Counseling Psychologist, 45(1), 66-75.
[3] Ericsson, K. A., Krampe, R. T., & Tesch-Römer, C. (1993). The role of deliberate practice in the acquisition of expert performance. Psychological review, 100(3), 363.
[4] Goldberg, S. B., Rousmaniere, T., Miller, S. D., Whipple, J., Nielsen, S. L., Hoyt, W. T., & Wampold, B. E. (2016). Do psychotherapists improve with time and experience? A longitudinal analysis of outcomes in a clinical setting. Journal of Counseling Psychology, 63(1), 1.
[5] Wampold, B. E., & Brown, G. S. J. (2005). Estimating variability in outcomes attributable to therapists: a naturalistic study of outcomes in managed care. Journal of consulting and clinical psychology, 73(5), 914.
[6] Stein, D. M., & Lambert, M. J. (1984). On the relationship between therapist experience and psychotherapy outcome. Clinical Psychology Review, 4(2), 127-142.
[7] Walfish, S., McAlister, B., O'donnell, P., & Lambert, M. J. (2012). An investigation of self-assessment bias in mental health providers. Psychological Reports, 110(2), 639-644.
[8] Hatfield, D., McCullough, L., Frantz, S. H., & Krieger, K. (2010). Do we know when our clients get worse? An investigation of therapists' ability to detect negative client change. Clinical Psychology & Psychotherapy, 17(1), 25-32.
[9] Hartmann, A., Joos, A., Orlinsky, D. E., & Zeeck, A. (2015). Accuracy of therapist perceptions of patients' alliance: Exploring the divergence. Psychotherapy Research, 25(4), 408-419.
[10] Ahn, H., & Wampold, B. E. (2001). Where oh where are the specific ingredients? A meta-analysis of component studies in counseling and psycotherapy. Journal of Counseling Psychology, 48(3), 251–257.
[11] Messer, S. B., & Wampold, B. E. (2002). Let's face facts: Common factors are more potent than specific therapy ingredients. Clinical Psychology: Science and Practice, 9(1), 21-25.
[12] Goodyear, R. K., Wampold, B. E., Tracey, T. J., & Lichtenberg, J. W. (2017). Psychotherapy expertise should mean superior outcomes and demonstrable improvement over time. The Counseling Psychologist, 45(1), 54-65.
[13] Tracey, T. J., Wampold, B. E., Lichtenberg, J. W., & Goodyear, R. K. (2014). Expertise in psychotherapy: An elusive goal?. American Psychologist, 69(3), 218.
[14] Rousmaniere, T., Goodyear, R. K., Miller, S. D., & Wampold, B. E. (Eds.). (2017). The cycle of excellence: Using deliberate practice to improve supervision and training. John Wiley & Sons.
[15] Ericsson, A., & Pool, R. (2016). Peak: Secrets from the new science of expertise. Houghton Mifflin Harcourt.
Horário de Atendimento
2ª a 6ª - 8:00h às 21:00h
Sábados - 10:00h às 15:00h
Marcação/Informações
Tel: 218 811 710
2ª a 6ª - 11:00h às 13:00h
e das 14:30h às 19:00h
Email: clinica@ispa.pt
Morada: Rua Jardim do Tabaco, 74, 2º
1149-041 Lisboa